Um positivo e otimista tributo ao Rock ‘n’ Roll.
Bohemian Rhapsody é o relato cinematográfico da vida e obra de Freddie Mercury, e da banda britânica Queen. Desnecessário dizer o tamanho da importância de Freddie Mercury e do Queen não só para o cenário da música, mas para a Cultura Pop como um todo. Quem conhece um pouquinho da história de Freddie Mercury sabe que temas polêmicos, obscuros e pesados fazem parte desta história, e a maneira como estes assuntos seriam trabalhados em cena seria algo primordial para a definição da solidez do enredo.
O filme acompanha a trajetória da banda desde a sua formação em 1970, os primeiros passos, a explosão para o sucesso, o relacionamento entre os membros, e os momentos mais importantes da gloriosa do Queen. O foco é na vida de Freddie Mercury, suas realizações, seus medos e inseguranças, e tudo que ao longo fez dele não só um astro do rock incomparável, mas um ser humano admirável.
A narrativa é fluida, em nenhum momento se mostra cansativa ou arrastada, pelo contrário, nas mais de duas horas de filme não há um momento em que o mesmo fica entediante.

Gwilym Lee (Brian May) e Rami Malek (Freddie Mercury) em BOHEMIAN RHAPSODY da Twentieth Century Fox. Foto: Alex Bailey.
O roteiro do filme é sólido e muito bem resolvido, conhece muito bem o tom e o caminho que deseja seguir. Nesta linha fica fácil entendermos as escolhas que o roteiro faz ao abordar os temas mais delicados recorrentes a vida de Freddie: seu relacionamento conturbado e cheio de cumplicidade com Mary, que foi, de longe, a pessoa mais importante de sua vida, sua relação com os outros membros da banda, a vida de exageros e extravagâncias, que viveu com muita intensidade o lema “sexo, drogas e rock ‘n’ roll”, e que no final cobrou seu preço. E, claro, sua sexualidade.
Mas tanto a sexualidade quanto os demais temas são tratados com naturalidade, sem nenhum tipo de ênfase exagerada, sem discursos panfletários, sem usar o tema como “muleta” para apoiar a história.
Muito pelo contrário, a todo tempo o roteiro faz questão e valorizar o lado humano de Freddie Mercury, seus erros e acertos, a fragilidade e o medo da solidão, suas variadas formas de amar, o peso e a consequências de suas escolhas. O lado de artista também é bastante valorizado, desde a genialidade e a inspiração em suas composições, até o seu desempenho de palco, que ainda hoje é algo sem igual. O filme ressalta ainda mais Freddie como um inigualável astro do rock.
Por falar em composições, o filme retrata a criação de alguns dos clássicos da banda, como “We Will Rock You”, “Another One Bites The Dust” como também a icônica e revolucionária “Bohemian Rhapisody”, que claramente recebe uma atenção especial no filme que a detalha passando pelos eventos que na criação de uma das obras musicais mais revolucionárias de todos os tempos.
Outro ponto delicado em que o filme precisa tocar é a questão da AIDS, fruto da vida de excessos de Freddie em uma época em que muito pouco se sabia sobre o vírus, o que o tornava irremediavelmente letal. Ao invés de tentar emular os momentos finais de Freddie sendo enfim vencido pela doença, o roteiro investe na positividade do protagonista. Mesmo sabendo que iria morrer em nenhum momento Freddie aceita a posição de vítima, ao contrário, seu desejo era ser lembrado pelo legado e pela imagem do grande artista que foi. Este é outro ponto em que o roteiro muito bem resolvido, consegue atingir plenamente seu objetivo, pois é o clima de bem-estar e otimismo que preenche os corações dos expectadores ao final do filme.
Como dito anteriormente, não se aprofundar em determinadas questões pode, por muitos, ser considerado um erro, o que discordo, pois entendo que abordar este assunto através do ponto de vista de Freddie e da maneira como ele lidava com estes assuntos é uma escolha, e o roteiro desenvolve a história de maneira solida a partir dela. Aliás por falar em emoções, elas estão presentes em todo o filme, mas explodem num momento apoteótico no terceiro ato.
O filme revive a apresentação do Queen no Live Aid, evento contra a fome na África com dois shows acontecendo simultaneamente na Filadélfia, Estados Unidos, e em Londres, na Inglaterra, reunindo os maiores nomes da música na época. As apresentações eram curtas devido ao número gigantesco de atrações, e com um set de 06 músicas e quase meia hora de show, o Queen realizou uma das maiores performances de uma banda de Rock em todos os tempos.
O filme reproduz este momento de maneira brilhante, resgata de maneira genuína toda a atmosfera que envolveu o evento que ganha ainda mais notoriedade devido à jornada de Freddie até ali. A cada momento em que o filme reproduz a épica apresentação a comoção aumenta e é impossível não se emocionar. Assisti a cada momento com um sorriso no rosto e lágrimas nos olhos. E, sério, se você não se emocionou nem um pouquinho com esse filme você, sem dúvida, não tem coração!
O elenco foi outra escolha acertada do filme. A dinâmica em cena dos atores funciona de forma excelente, valorizados pelo destaque e pelo tempo de tela para cada personagem, principalmente quando falamos dos integrantes da banda.

Caracterização incrível dos membros da banda.
Joseph Mazzello interpreta o baixista John Deacon, Ben Hardy vive o baterista Roger Taylor e Gwilym Lee é simplesmente a pura encarnação do lendário guitarrista Brian May. Aliás, a caracterização de todos personagens, em especial os da banda, está fantástica. Destaque para a naturalidade com que o filme trata o relacionamento entre os membros da banda, os fortes laços afetivos e o talento musical impressionante do quarteto reunido.
Agora falando de Rami Malek como Freddie Mercury. Sua atuação ficou longe de ser caricata ou artificial, muito pelo contrário, é solida, lúcida e, sobretudo, sincera dentro da mensagem que o filme se propõe a transmitir. Além disso, Malek conseguiu representar muito bem o sotaque, o modo de falar, os trejeitos e principalmente a extravagancia teatral de Freddie no palco, com sua linguagem corporal magnética e eletrizante. O ator reage muito bem também nas cenas de alivio cômico, que apesar de poucos, são suaves e muito bem inseridos e atendem muito ao seu propósito.

Rami Malek emociona como Freddie Mercury.
A atuação de Malek é digna de indicação ao Oscar e, mesmo com a dura concorrência que se desenha para a premiação em 2019, com certeza Malek surgirá como forte candidato, pela atuação e pela transformação já que a caracterização também está excelente. Pode pesar contra ele o fato de não cantar durante o filme, as canções são interpretadas pelo próprio Freddie ou por um cantor profissional, o que não desmerece o trabalho do ator que é simplesmente fantástico.
Através da história de Freddie vivenciamos grandes momentos não só da carreira do Queen, mas da vida profissional e particular de Freddie, como sua devoção por sua ex-mulher Mary (Lucy Boynton) e seu relacionamento mais estável, por assim dizer, com o cabelereiro Jim Hutton (Aaron McCusker).
O filme é ambientado entre as décadas de 70 e 80 e, graças à qualidade tanto do figurino quanto da fotografia, nos sentimos absolutamente inseridos na época do filme.
A trilha sonora por sua vez é sensacional, retirada, claro, do repertório do Queen. Você sente que vem algo especial logo no início do filme quando ouvimos a vinheta de abertura da Fox em um maravilhoso solo de Guitarra.
A direção ficou a cargo de Brian Synger que tem em seu currículo 4 filmes dos X-Man, Superman: O Retorno, e Operação Valkíria. Synger com certeza fez um excelente trabalho. Fez uma ótima escolha ao querer contar um história que não ignora seu lado mais polêmico e delicado, mas que valoriza o ser humano e seu poder de modificar positivamente todo o ambiente em que vive, tudo isso sendo mostrado de maneira prática e muito funcional durante o longa.
Quanto ao roteiro este ficou a cargo de Anthony McCarthy que também roteirizou O Destino de Uma Nação, colaborou para o roteiro Peter Morgan (de O Último Rei da Escócia) além de dois membros da banda Queen, Brian May e Roger Taylor.
De negativo apenas a manipulação cronológica de que alguns acontecimentos que o filme faz para deixar mais enfático, poético e emocionante seu final, nada que comprometa a trama ou ofenda a história real. Há quem diga que preferia uma biografia mais realista com um discurso mais decidido sobre temas polêmicos, o que eu absolutamente dispenso. Conheço a história real, sei como ela acaba.
O cinema nos permite, sim, olhar para esta trajetória com outros olhos, nos prendermos a outros valores que parecem cada vez mais esquecidos nos dias de hoje e, acima de tudo, entendermos um pouco mais do real significado de amor, humanidade e esperança. E se alguém achar que, ao agir assim, o filme “romantiza” a história, me desculpem, mas eu não gostaria que fosse de outro jeito.
Bohemian Rhapsody
Resumo
Bohemian Rhapsody é um tributo ao Queen, a Freddie Mercury, e a toda a história da musica, mas acima de tudo é uma mensagem de amor, esperança e superação naquele que é sem sombra de duvida o filme mais emocionante de 2018.

Conheceu os quadrinhos (que carinhosamente chama de Gibi) no fim dos anos 80 e deles nunca mais se separou. Gamer old school, ávido devorador de bons livros, amante da sétima arte, comentarista de rádio. Escreve para uma comunidade de cultura pop, e é o mais recente membro honorário do Conselho de Elrond.
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